Pergunta: Somos duas moças inglesas visitando a índia. Sabemos pouco da Ioga e estamos aqui porque nos disseram que os mestres espirituais desempenham um papel importante na vida da índia.
Maharaj: Vocês são bem-vindas. Não encontrarão nada novo aqui. O trabalho que estamos fazendo é atemporal. Era o mesmo há dez mil anos e será o mesmo dez mil anos à frente. Os séculos passam, mas o problema humano não muda - o problema do sofrimento e do fim do sofrimento.
P: Outro dia, apareceram sete jovens estrangeiros pedindo um lugar para dormir algumas noites. Eles vieram para ver o Guru que estava dando conferência em Bombaim. Eu o conheci, era um homem jovem, muito agradável, aparentemente muito prosaico e eficiente, mas com uma atmosfera de silêncio e de paz ao seu redor. Seu ensinamento é tradicional, com ênfase na Karma Ioga, trabalho desinteressado, serviço ao Guru, etc. Como o Gita, ele diz que o trabalho altruísta dará como resultado a salvação. Ele está cheio de planos ambiciosos e procura trabalhadores que abrirão centros espirituais em muitos países. Parece que não só lhes dá a autoridade, mas, também, o poder para fazer o trabalho em seu nome.
M: Sim, há a transmissão do poder.
P: Quando estive com eles, tive o estranho sentimento de tornar-me invisível. Os devotos, em sua entrega ao Guru, entregaram a mim também! O que quer que eu fizesse por eles era o fazer de seu Guru e eu não seria considerada, exceto como um mero instrumento. Eu era somente uma torneira a girar para a esquerda ou para a direita. Não havia nenhum tipo de relação pessoal. Eles tentaram um pouco converter-me à sua fé; como logo sentiram resistência, simplesmente deixaram-me fora do campo de sua atenção. Mesmo entre eles não pareciam muito relacionados; era o interesse comum em seu Guru o que os mantinha juntos. Achei isto particularmente frio, quase desumano. Considerar-se um instrumento nas mãos de Deus é uma coisa; negar a alguém toda a atenção e consideração porque ‘tudo é Deus’ pode levar à indiferença próxima à crueldade. Afinal de contas, todas as guerras são feitas ‘em nome de Deus’. Toda a história da humanidade é uma sucessão de ‘guerras santas'. Não se é nunca tão impessoal quanto na guerra!
M: Insistir e resistir estão contidos na vontade de ser. Elimine a vontade de ser. e o que permanecerá? A existência e a não existência relacionam-se com algo no tempo e no espaço; aqui e agora, ali e então, os quais de novo estão na mente. A mente realiza um jogo de adivinhação; sempre está incerta; dominada pela ansiedade e inquieta. Você se ressente por ser tratada como um mero instrumento de algum deus, ou Guru, e insiste em ser tratada como uma pessoa, porque você não está segura de sua própria existência e não quer abandonar a comodidade e segurança de uma personalidade. Você pode não ser o que você acredita ser, mas isso lhe dá continuidade, seu futuro flui para o presente e se converte no passado sem sobressaltos. Que seja negada a alguém a existência pessoal é espantoso, mas você deve encarar isto e descobrir sua identidade com a totalidade da vida. Então, já não haverá o problema de quem é usado por quem.
P: Toda a atenção que tive foi uma tentativa de converter-me à fé que professavam. Quando resisti, perderam todo interesse em mim.
M: Alguém não se torna um discípulo pela conversão ou por acidente. Há geralmente uma conexão antiga, mantida através de muitas vidas, e que floresce como amor e confiança, sem o que não há discipulado.
P: O que fez você decidir tornar-se um mestre?
M: Fizeram-me mestre por chamar-me assim. Quem eu sou para ensinar, e a quem? O que eu sou você é, e o que você é - eu sou. O ‘eu sou’ é comum a todos nós; além do ‘eu sou’ há a imensidade da luz e do amor. Não a vemos porque olhamos para outra parte; eu só posso apontar para o céu; ver a estrela é coisa sua. Alguns levam mais tempo para ver a estrela, outros menos; depende da claridade de sua visão e da sua seriedade na busca; estas duas coisas devem ser próprias - eu só posso encorajar.
P: O que se espera que eu faça quando me tornar uma discípula?
M: Cada mestre tem seu próprio método, geral mente seguindo o padrão de ensinamentos de seu Guru e do modo em que ele mesmo se realizou, e sua própria terminologia também. Dentro desta estrutura são feitos ajustes à personalidade do discípulo. Ao discípulo se dá plena liberdade de pensamento e inquirição, e é encorajado a questionar o conteúdo de seu coração. Ele deve estar absolutamente certo sobre a posição e a competência de seu Guru; de outro modo sua fé não será absoluta, nem sua ação completa. O absoluto em você é o que a leva ao absoluto além de você - verdade absoluta, amor, abnegação são os fatores decisivos na autorrealização. Com seriedade, podem ser alcançados.
P: Entendi que se deve abandonar a família e as posses para tornar-se um discípulo.
M: Isto varia com o Guru. Alguns esperam que seus discípulos maduros se convertam em ascetas e reclusos; alguns encorajam à vida e aos deveres familiares. A maioria deles considera o modelo da vida de família mais difícil que a renúncia, adequado para uma personalidade mais amadurecida e melhor equilibrada. Nas primeiras etapas, a disciplina da vida monástica pode ser aconselhável. Consequentemente, na cultura hindu se espera que os estudantes até os 25 anos vivam como monges - na pobreza, castidade e obediência -, para dar a eles a oportunidade de construir um caráter capaz de enfrentar as dificuldades e tentações da vida de casado.
P: Quem são as pessoas nesta sala? São seus discípulos?
M: Pergunte a eles. Não é no nível verbal que alguém se toma um discípulo, mas nas profundidades silenciosas de seu próprio ser. Você não se torna um discípulo por escolha; é mais questão de destino que da própria vontade. Não importa muito quem é o mestre - todos querem o seu bem. O que importa é o discípulo - sua honestidade e seriedade. O discípulo certo sempre encontrará o mestre certo.
P: Posso ver a beleza e sentir a felicidade de uma vida dedicada à busca da verdade sob um mestre competente e amoroso. Desgraçada- mente, nós devemos regressar à Inglaterra.
M: A distância não importa. Se seus desejos forem fortes e verdadeiros, eles moldarão sua vida para alcançar a realização. Semeie sua semente e deixe-a às estações.
P: Quais são os sinais de progresso na vida espiritual?
M: Estar livre de toda ansiedade; um sentido de calma e alegria; uma profunda paz interior e uma abundante energia exterior.
P: Como você obteve isto? M: Encontrei tudo na santa presença de meu Guru - não fiz nada por mim mesmo. Ele me falou para ficar quieto - e foi o que fiz - tanto quanto pude.
P: A sua presença é tão poderosa quanto a dele? M: Como vou sabê-lo? Para mim, ele é a única presença. Se você está comigo, está com ele.
P: Cada Guru me remeterá a seu próprio Guru. Onde está o ponto de partida?
M: Há um poder no universo trabalhando pela iluminação e pela liberação. Nós o chamamos Sadashiva, o qual está sempre presente no coração dos homens. Ele é o fator unificador. A unidade libera, a liberdade une. No final das contas, nada é meu nem seu - tudo é nosso. Seja uma consigo mesma e será uma com tudo, estará em casa no universo inteiro.
P: Você quer dizer que todas estas glórias virão simplesmente por permanecer no sentimento ‘eu sou’?
M: É o simples que é certo, não o complicado. De algum modo. as pessoas não confiam no simples, no fácil, no que está sempre disponível. Por que não dar um julgamento honesto para o que eu digo? Pode parecer muito pequeno e insignificante, mas é como uma semente que cresce e se transforma em uma poderosa árvore. Dê a si mesma uma oportunidade!
P: Vejo muitas pessoas sentadas aqui - tranquilamente. O que você tem para que venham?
M: Para encontrar a si mesmas. Em casa, o mundo é por demais para elas. Aqui nada as perturba; têm uma oportunidade de deixar suas preocupações diárias e contatar o essencial nelas mesmas.
P: Qual é o curso de treinamento na Consciência de si mesmo?
M: Não há necessidade de treinamento. A Consciência sempre está com você. A mesma atenção que dá ao exterior você volta para o interior. Não é necessário nenhum tipo novo ou especial de Consciência.
P: Você ajuda as pessoas pessoal mente?
M: As pessoas vêm discutir seus problemas. Aparentemente obtêm alguma ajuda, ou elas não viriam.
P: As conversas com as pessoas sempre são em público, ou fala para elas também privadamente?
M: É de acordo com o desejo delas. Pessoalmente, não faço distinções entre o público e o privado.
P: Você está sempre disponível, ou tem outro trabalho a fazer?
M: Sempre estou disponível, mas as horas da manhã e as do final da tarde são as mais convenientes.
P: Entendi que nenhum trabalho tem um grau superior ao do mestre espiritual.
M: O motivo importa supremamente.
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