21- QUEM SOU EU?

Pergunta: Aconselham-nos a adoração da realidade personificada como Deus ou como o Homem Perfeito. Foi dito que não tentemos a adoração do Absoluto, como algo demasiado difícil para uma consciência centrada no cérebro. 

Maharaj: A verdade é simples e aberta a todos. Por que complicá-la? A verdade é amorosa e amável. Inclui tudo, aceita tudo, purifica tudo. É o falso que é difícil e a origem do problema. Ele sempre quer, espera, exige. Sendo falso, ele é vazio, sempre em busca de confirmação e nova garantia. Teme e evita a investigação. Identifica-se com qualquer coisa em que possa apoiar-se, por muito débil e momentânea que seja. O que quer que obtenha, ele perde, e pede mais. Portanto, não confie no consciente. Nada do que você possa ver, sentir ou pensar é assim. Mesmo o pecado e a virtude, o mérito e o demérito não são o que parecem. Usualmente, o mau e o bom são questão de convenções e costumes, e são rechaçados ou aceitos de acordo com as palavras que são usadas. 

P: Não há desejos bons e maus, elevados e baixos? 

M: Todos os desejos são maus, mas alguns são piores que outros. Persiga qualquer desejo, ele sempre lhe acarretará problemas. 

P: Mesmo o desejo de ser livre de desejos? 

M: Por que ter algum desejo? Desejar um estado livre de desejos não o liberará. Nada pode libertá-lo porque você é livre. Veja-se com a claridade livre de desejos, isso é tudo. 

P: Leva tempo conhecer a si mesmo. 

M: Como o tempo poderia ajudá-lo? O tempo é uma sucessão de momentos; cada momento aparece do nada e desaparece no nada, para não reaparecer jamais. Como poderia construir sobre algo tão fugaz? 

P: O que é permanente? 

M: Busque em você mesmo o permanente. Aprofunde em seu interior e encontre o que é real em você. 

P: Como buscar a mim mesmo? 

M: O que quer que aconteça, acontecerá a você. Faça o que fizer, o agente estará em você. Encontre o sujeito de tudo o que você é como uma pessoa. 

P: Que outra coisa eu posso ser? 

M: Descubra. Mesmo se eu lhe disser que você é a testemunha, o observador silencioso, não terá nenhum sentido para você a menos que encontre o caminho para seu próprio ser. 

P: Minha pergunta é: Como encontrar o caminho para o próprio ser? 

M: Abandone todas as perguntas exceto uma: ‘Quem sou eu?’. Depois de tudo, o único fato de que está certo é que você é. O ‘eu sou’ é certo. O ‘Eu sou isto’ não é. Lute para descobrir o que você é na realidade. 

P: Não tenho feito outra coisa durante os últimos sessenta anos. 

M: Que há de errado em se esforçar? Por que buscar resultados? O próprio esforço é sua verdadeira natureza. 

P: Esforçar-se é doloroso. 

M: Você o faz doloroso ao buscar resultados. Lute sem buscar resultados, lute sem ambição. 

P: Por que Deus me fez como sou? 

M: De que Deus você está falando? O que é Deus? Não é ele a própria luz que torna possível a pergunta? O próprio ‘eu sou’ é Deus. A própria busca é Deus. Na busca, você descobrirá que não é nem o corpo nem a mente, e que o amor do si mesmo em você é pelo si mesmo em todos. Os dois são um. A consciência em você e a consciência em mim, aparentemente duas, realmente uma, buscam a unidade, e isto é amor. 

P: Como encontrar o amor? 

 M: O que ama agora? O ‘eu sou’. Dê a ele seu coração e sua mente e não pense em nada mais. Quando isto for feito sem esforço e de forma natural, será o estado mais elevado. Nele, o próprio amor é o amante e o amado. 

P: Todo o mundo quer viver, existir, isto não é amor a si mesmo? 

M: Todo desejo tem sua origem no si mesmo. Tudo é questão de escolher o desejo correto. 

P: Correto e incorreto variam com o costume e com o hábito. Os padrões mudam de acordo com as sociedades. 

M: Rechace todos os padrões tradicionais. Deixe-os para os hipócritas. Apenas o que o libera do desejo, do medo e das falsas ideias é bom. Enquanto preocupar-se com o pecado e com a virtude, não terá paz. 

P: Admito que o pecado e a virtude são normas sociais. Mas podem existir pecados e virtudes espirituais. Por espiritual quero dizer o absoluto. Existe algo como o pecado e a virtude absolutos? 

M: O pecado e a virtude se referem a uma pessoa apenas. Sem uma pessoa pecadora ou virtuosa, o que é o pecado ou a virtude? No nível do absoluto não há pessoas; o oceano da Consciência pura não é nem virtuoso nem pecaminoso. O pecado e a virtude são invariavelmente relativos. 

P: Posso eliminar essas noções desnecessárias? 

M: Não enquanto você mesmo pensa ser uma pessoa. P: Através de que sinal eu saberei que estou além do pecado e da virtude? 

M: Por liberar-se de todo o desejo e temor, da própria ideia de ser uma pessoa. Alimentar ideias como ‘sou um pecador', ‘não sou um pecador’ é pecado. Identificar-se com o particular é todo o pecado que existe. O impessoal é real, o pessoal aparece e desaparece, ‘eu sou’ é o Ser impessoal. ‘Eu sou isto’ é a pessoa. A pessoa é relativa e o Ser puro - fundamental. 

P: Sem dúvida, o Ser puro não é inconsciente, nem destituído de discriminação. Como pode estar além do pecado e da virtude? Diga-nos, por favor, ele tem inteligência ou não? 

M: Todas estas perguntas surgem de sua crença de que você é uma pessoa. Vá além do pessoal e veja. 

P: O que quer dizer exatamente quando me pede que pare de ser uma pessoa? 

 M: Não peço que você pare de ser - você não pode. Eu lhe peço somente para parar de imaginar que você nasceu, que tem pais, que é um corpo, que vai morrer e assim por diante. Apenas tente, comece: não é tão difícil quanto parece.

P: Pensar-se como o pessoal é o pecado do impessoal. 

M: De novo o ponto de vista pessoal! Por que insiste em corromper o impessoal com suas ideias de pecado e virtude? São ideias irrelevantes. O impessoal não pode ser descrito em termos de bem e mal. Ele é Ser - Sabedoria - Amor - todos absolutos. Há aí lugar para o pecado? E a virtude é apenas o oposto do pecado. 

P: Falamos da virtude divina. 

M: A verdadeira virtude é a natureza divina (swampa). O que você é realmente é sua virtude. Mas o contrário do pecado, o que você chama virtude, é apenas obediência nascida do medo. 

P: Então por que se esforçar em ser bom? 

M: Isto o mantém em movimento. Você se move continuamente até que encontra Deus. Então Deus o leva a Ele mesmo - e o faz como Ele é. 

P: O mesmo ato é considerado natural em um momento e pecado em outro. O que o converte em pecaminoso? 

M: Qualquer coisa que faça contra seu melhor conhecimento é pecado. 

P: O conhecimento depende da memória. 

M: Recordar seu ser é virtude, esquecê-lo é pecado. Tudo se resume a este elo mental ou psicológico entre o espírito e a matéria. Podemos chamar a este elo de psique (antahkarana). Quando a psique é tosca, sem desenvolvimento, bastante primitiva, estará sujeita a ilusões grosseiras. À medida que ela cresce em amplitude e sensibilidade, chegará a ser um elo perfeito entre a matéria e o espírito puro, e dará sentido à matéria e expressão ao espírito. Há o mundo material (mahakadash) e o espiritual (paramakash). Entre ambos está a mente universal (chidakash), que é também o coração universal (premakash). É a sabedoria do amor que faz dos dois um. 

P: Algumas pessoas são estúpidas, outras inteligentes. A diferença está na psique de cada uma. As maduras têm mais experiência. Assim como uma criança cresce por comer e beber, dormir e brincar, a psique do homem é modelada por tudo o que ele pensa, sente e faz, até que seja suficientemente perfeita para servir de ponte entre o espírito e o corpo. Como uma ponte que permite o tráfego entre as margens, assim a psique une a origem e sua expressão. 

M: Chame-a amor. A ponte é amor. 

P: Em última instância, tudo é experiência. O que quer que pensemos, sintamos ou façamos, é experiência. Por trás, está o experimentador. Assim tudo o que sabemos consiste nestes dois itens, o experienciador e a experiência. Mas os dois são realmente um - o experienciador é a experiência. Ainda assim, o experienciador crê que a experiência está fora. Do mesmo modo, o espírito e o corpo são um; eles apenas aparecem como dois. 

M: Para o Espírito não há um segundo. 

P: Então, a quem aparece o segundo? Parece-me que a dualidade é uma ilusão induzida pela imperfeição da psique. Quando a psique for perfeita, a dualidade não mais será vista. 

M: Você o disse. 

P: Não obstante, devo repetir minha muito simples pergunta: quem faz a distinção entre o pecado e a virtude? 

M: O que tem um corpo peca com o corpo; o que tem uma mente peca com a mente. 

P: Indubitavelmente, a mera posse de um corpo e de uma mente não compele ao pecado. Deve haver um terceiro fator na raiz disto. Volto repetidamente a esta questão do pecado e da virtude porque neste tempo os jovens afirmam que não existe pecado, que não é preciso ser débil e que se deve seguir o desejo do momento. Não aceitam nem a tradição nem a autoridade, e só podem ser influenciados por um pensamento honesto e sólido. Se não cometem certos atos, é mais por medo da polícia que por convicção. Sem dúvida, deve haver algo no que dizem, pois vemos como nossos valores mudam de um lugar para o outro e de um tempo para o outro. Por exemplo - matar em guerra hoje é uma grande virtude e, talvez, no próximo século seja considerado um crime horrível. 

M: Um homem que se move com a terra necessariamente experienciará dias e noites. Aquele que fica com o sol não conhecerá a escuridão. Meu mundo não é o seu. Tal como vejo, todos vocês estão atuando em um cenário. Não há realidade em suas idas e vindas. E os problemas de vocês são tão irreais! 

P: Talvez sejamos sonâmbulos ou sujeitos a pesadelos. Você não pode fazer nada? 

M: Eu estou fazendo: entrei em seu estado de sonho para dizer-lhe - ‘Pare de causar danos a si mesmo e aos demais; pare de sofrer, desperte’. 

P: Então por que não despertamos? M: Vocês despertarão. Não serei frustrado. Pode levar algum tempo. Quando começarem a questionar seus sonhos, o despertar não estará longe.

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