87- MANTENHA A MENTE EM SILÊNCIO E VOCÊ DEVE DESCOBRIR

 Pergunta: Uma vez tive uma estranha experiência. Eu não existia nem era o mundo, só havia luz, dentro e fora, e uma imensa paz. Isto durou quatro dias, e logo voltei à consciência cotidiana. Agora, tenho o sentimento de que tudo quanto sei é um mero andaime que cobre e oculta o edifício em construção. O arquiteto, o projeto, os planos, o propósito - nada disso conheço; há certa atividade em marcha, acontecem coisas; isso é tudo o que posso dizer. Eu sou esse andaime, uma coisa muito frágil e de vida curta; quando a construção estiver pronta, o andaime será desmontado e removido. O ‘eu sou’ e ‘O que eu sou’ não têm importância porque, uma vez que o edifício esteja pronto, o ‘eu’ desaparecerá como uma questão de sequência do tempo, sem deixar perguntas a serem respondidas. 

Maharaj: Você não está consciente de tudo isto? O fator constante não é a realidade da Consciência? 

P: Meu sentido de permanência e identidade é devido à memória, a qual é tão evanescente e não confiável. Quão pouco eu lembro, mesmo do passado recente! Vivi o tempo de uma vida e, agora, o que me resta? Um punhado de eventos, no melhor dos casos, uma história breve. 

M: Tudo isto acontece dentro de sua consciência. 

P: Dentro e fora. Durante o dia, dentro; na noite, fora. A consciência não é tudo. Acontecem tantas coisas além de seu alcance. Dizer que não existe aquilo do qual não sou consciente é totalmente errado. 

M: O que você diz é lógico, mas você realmente só conhece o que há em sua consciência. O que você reivindica que existe fora de sua experiência consciente é inferido. 

P: Pode ser inferido e, mesmo assim, é mais real que o sensório. 

M: Tenha cuidado. No momento em que você começa a falar, você cria um universo verbal, um universo de palavras, ideias, conceitos e abstrações, interligadas e interdependentes, maravilhosamente capazes de gerar-se. sustentando-se e explicando-se umas às outras e, ainda assim. desprovidas de essência ou substância, meras criações da mente. As palavras alimentam palavras, a realidade é silenciosa. 

P: Quando você fala, eu o ouço. Não é um fato? 

M: É um fato que você ouve. O que você ouve, não é. O fato pode ser experienciado e, nesse sentido, o som da palavra e das ondas mentais que ela causa são experienciados. Não há nenhuma outra realidade por trás disso. Seu significado é puramente convencional, para ser relembrado; uma linguagem pode ser facilmente esquecida, a menos que a pratique. 

P: Se não há realidade nas palavras, por que falamos de qualquer forma? 

M: Elas servem ao limitado propósito de comunicação interpessoal. As palavras não comunicam fatos, elas os sinalizam. Uma vez que você esteja além da pessoa, você não necessita de palavras. 

P: O que pode levar-me além da pessoa? Como ir além da consciência? 

M: Palavras e perguntas chegam da mente e o seguram ali. Para ir além da mente, você deve ser tranquilo e silencioso. Paz e silêncio, silêncio e paz - este é o caminho para ir além. Deixe de fazer perguntas. 

P: Uma vez que eu desista de fazer perguntas, o que farei?

M: O que você pode fazer, exceto esperar e observar? 

P: O que devo esperar? 

M: Que o centro de seu ser surja na consciência. Os três estados - dormir, sonhar e vigília - estão todos na consciência, o manifestado; o que você chama inconsciência também se manifestará no devido tempo; além da consciência, geralmente, está o não manifestado. E além de tudo, e penetrando tudo, está o coração do ser que bate firmemente - manifestado-não manifestado, manifestado-não manifestado (saguna- nirguna). 

P: No nível verbal soa tudo bem. Posso visualizar-me como a semente do ser, um ponto na consciência, com meu sentido ‘eu sou’ pulsando, aparecendo e desaparecendo alternadamente. Mas o que fazer para compreendê-lo como um fato, para ir além, para dentro da Realidade imutável e silenciosa? 

M: Você não pode fazer nada. O que o tempo trouxe, o tempo levará embora. 

P: Então por que todas estas exortações à prática da Ioga e busca da realidade? Elas me fazem sentir poderoso e responsável, enquanto, de falo, é o tempo que faz tudo. 

M: Este é o fim da Ioga - realizar a independência. Tudo quanto acontece, acontece na mente e para a mente, não para a fonte do ‘eu sou’. Uma vez que compreenda que tudo acontece por si mesmo (chame-o destino, vontade de Deus, ou mero acidente), você permanecerá apenas como a testemunha, que compreende e aprecia, mas é imperturbável. 

P: Se eu deixar de confiar completamente nas palavras, qual será minha condição? 

M: Há uma estação para confiar e outra para desconfiar. Deixe que as estações façam o trabalho delas, por que se preocupar? 

P: De algum modo, eu me sinto responsável pelo que acontece a meu redor. 

M: Você só é responsável pelo que você pode mudar. Tudo o que você pode mudar é apenas sua atitude. Aí está sua responsabilidade. P: Está me aconselhando a que permaneça indiferente à aflição dos outros! 

M: Não é que você não seja indiferente. Todos os sofrimentos da humanidade não o impedem de apreciar sua próxima refeição. A testemunha não é indiferente. Ela é a plenitude do entendimento e da compaixão. Apenas como testemunha, você pode ajudar a outro. 

P: Durante toda minha vida fui alimentado por palavras. O número de palavras que ouvi e li chega a bilhões. Isto me beneficiou? Não, de modo algum. 

M: A mente molda a linguagem e a linguagem molda a mente. Ambas são ferramentas: use-as, mas não mal. As palavras podem levá-lo até seu próprio limite; para ir além, você deve abandoná-las. Permaneça apenas como a testemunha silenciosa. 

P: Como fazer isto? O mundo me perturba muito. 

M: Isso é porque você se pensa suficientemente grande para ser afetado pelo mundo. Não é assim. Você é tão pequeno que nada pode forçá-lo. Sua mente é que fica aprisionada, não você. Conheça-se tal como é - um mero ponto na consciência, sem dimensão e atemporal. Você é como a ponta de um lápis - pelo mero contato com você, a mente traça sua imagem do mundo. Você é único e simples, a imagem é complexa e abrangente; não seja enganado pela imagem, permaneça consciente desse pequeno ponto que está em todas as partes da imagem. O que é pode deixar de ser; o que não é pode vir a ser; mas o que nem é nem não é, e do qual depende o ser e o não ser, é impenetrável. Saiba que você é a causa do desejo e do medo, sendo você mesmo livre de ambos.

P: Como eu sou a causa do medo? 

M: Tudo depende de você. É por seu consentimento que o mundo existe. Retire a crença em sua realidade e ele se dissolverá como um sonho. O tempo pode derrubar montanhas, quanto mais você. que é a origem atemporal do tempo. Pois, sem memória e sem expectativa, não pode haver tempo. 

P: O ‘eu sou’ é o Último? 

M: Antes que você possa dizer ‘eu sou’, você deve existir para dizê-lo. O Ser não necessita ser autoconsciente. Você não precisa saber para ser, mas você deve ser para saber. 

P: Senhor, eu estou afogado em um mar de palavras! Posso ver que tudo depende de como se juntam as palavras, mas deve haver alguém que as junte de forma significativa. Por escrever palavras aleatoriamente, o Ramayana, o Mahabharata e o Bhagavata não poderiam ser produzidos. A teoria da emergência acidental não é sustentável. A origem do significativo deve estar além disto. Qual é este poder que cria ordem do caos? Viver é mais do que ser; e a consciência é mais que viver. Quem é o ser vivo consciente? 

M: Sua pergunta contém a resposta: um ser vivo consciente é um ser vivo consciente. As palavras são mais apropriadas, mas você não entende seu pleno significado. Aprofunde-se no significado das palavras ser, vivo, consciente e deixará de andar em círculos, fazendo perguntas, mas perdendo as respostas. Compreenda que não pode fazer uma pergunta válida sobre si mesmo porque você não sabe sobre quem está perguntando. Na pergunta ‘Quem sou eu?’, o ‘eu’ não é conhecido, e a pergunta poderia ser assim expressa: Não sei o que quero dizer por ‘eu’. Você deve descobrir o que é. Eu só posso falar o que você não é. Você não e do mundo, nem mesmo está no mundo. O mundo não existe, só você existe. Você cria o mundo em sua imaginação, como um sonho. Como você não pode separar o sonho de você mesmo, do mesmo modo você não pode ter um mundo exterior independente de você. Você é independente, não o mundo. Não tenha medo de um mundo que você mesmo criou. Cesse de buscar felicidade e realidade num sonho, e você despertará; você não necessita conhecer todos os ‘porquê’ e os ‘como’, não há fim às perguntas. Abandone todos os desejos, mantenha sua mente silenciosa e você descobrirá.

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