Pergunta: Quando um homem comum morre, o que acontece para ele?
Maharaj: Segundo sua crença, assim acontece. Como a vida antes da morte é apenas imaginação, assim é a vida depois dela. O sonho continua.
P: E o que acontece com o gnani?
M: O gnani não morre porque ele nunca nasceu.
P: Ele aparece assim para os outros.
M: Mas não para ele mesmo. Nele mesmo ele é livre das coisas - físicas e mentais.
P: Não obstante, você deve conhecer o estado do homem que morreu. Ao menos de suas próprias vidas passadas.
M: Até encontrar meu Gum, eu sabia muitas coisas. Agora nada sei, pois todo conhecimento está apenas no sonho e não é válido. Conheço-me e não encontro nem vida nem morte em mim, apenas puro ser - não ser isto ou aquilo, mas simplesmente ser. Mas, no momento em que a mente, extraindo de seu estoque de memórias, começa a imaginar, ela preenche o espaço com objetos e o tempo com eventos. Como nem mesmo conheço este nascimento, como poderia conhecer nascimentos passados? É a mente que, em movimento, vê tudo se movendo e, tendo criado o tempo, inquieta-se sobre o passado e o futuro. Todo o universo se sustenta na consciência (maha tattva), a qual surge onde há ordem e harmonia perfeitas (maha sattva). Como todas as ondas estão no oceano, assim todas as coisas físicas e mentais estão na Consciência. Por conseguinte, a própria Consciência é essencial, não seu conteúdo. Aprofunde- a, amplie-a e todas as bênçãos fluirão em você. Você não necessita buscar nada, tudo virá a você da maneira mais natural e sem esforço. Os cinco sentidos e as quatro funções da mente - memória, pensamento, compreensão e individualidade; os cinco elementos - terna, água, fogo, ar e éter; os dois aspectos da criação - matéria e espírito, todos estão contidos na Consciência.
P: Ainda assim, você deve acreditar que viveu antes.
M: As escrituras dizem assim, mas não sei nada sobre isto. Conheço-me como Eu sou; como eu apareci, ou aparecerei, não está dentro de minha experiência. Não é que não me lembre. De fato, não há nada a lembrar. A reencarnação implica um eu que reencarna. Não há tal coisa. O feixe de memórias e esperanças chamado o ‘eu' imagina-se existindo eternamente e cria o tempo para acomodar sua falsa eternidade: para ser, não necessito nenhum passado ou futuro. Toda a experiência nasce da imaginação; eu não imagino, assim nenhum nascimento ou morte acontecem para mim. Apenas aqueles que pensam que nasceram podem pensar em renascer. Você está me acusando de ter nascido - declaro-me inocente! Tudo existe na Consciência, e a Consciência nem morre nem renasce. É a própria realidade imutável. Todo o universo da experiência nasce com o corpo e morre com o corpo; tem seu começo e fim na Consciência, mas a Consciência não conhece começo nem fim. Se você pensar cuidadosamente e matutar sobre isto por bastante tempo, você chegará a ver a luz da Consciência em toda sua claridade, e o mundo desaparecerá gradualmente de sua visão. É como olhar para uma vareta acesa de incenso; você verá a vareta e a fumaça em primeiro lugar; quando você perceber o ponto em brasa, você compreenderá que ele tem o poder de consumir montanhas de varetas e de encher o universo com fumaça. Atemporal mente, o eu se atualiza sem esgotar suas possibilidades infinitas. Na metáfora da vareta de incenso, a vareta é o corpo e a fumaça é a mente. Enquanto a mente estiver ocupada com suas contorções, não perceberá sua própria fonte. O Guru vem e volta sua atenção para a fagulha interior. Por sua própria natureza, a mente está voltada para fora; sempre tende a buscar a fonte das coisas entre as próprias coisas; ouvir que se deve buscar a fonte no interior é. de alguma maneira, o início de uma nova vida. A Consciência toma o lugar da consciência; na consciência há o ‘eu’, o qual é consciente, enquanto a Consciência é unificada; a Consciência é ciente de si mesma. O ‘eu sou' é um pensamento, enquanto a Consciência não o é; não há nenhum 'Eu sou consciente' na Consciência. A consciência é um atributo enquanto a Consciência não o é; pode-se ser cônscio de ser consciente, mas não consciente da Consciência. Deus é a totalidade da consciência, mas a Consciência está além de tudo - do ser e do não ser.
P: Eu comecei com a pergunta sobre a condição de um homem depois da morte. Quando seu corpo é destruído, o que acontece à sua consciência? Ele leva consigo seus sentidos de visão, audição, etc., ou os deixa para trás? E se ele perde seus sentidos, o que acontece a sua consciência?
M: Os sentidos são meros modos de percepção. Quando os modos mais grosseiros desaparecem, emergem estados mais finos de consciência.
P: Não há nenhuma transição para a Consciência depois da morte?
M: Não pode haver transição da consciência para a Consciência, pois a Consciência não é uma forma de consciência. A consciência pode apenas tornar-se mais sutil e refinada e é o que acontece depois da morte. À medida que os vários veículos do homem morrem, os modos de consciência induzidos por eles também desaparecem gradual mente.
P: Até que apenas reste a inconsciência?
M: Veja-se falando da inconsciência como de algo que vem e vai! Quem existe para ser consciente da inconsciência? Enquanto a janela está aberta, há luz do sol na sala. Com a janela fechada, o sol permanece, mas vê a escuridão na sala? Há escuridão para o sol? Não existe a inconsciência, pois ela não é experimentável. Nós inferimos a inconsciência quando há um lapso na memória ou na comunicação. Se eu parar de reagir, você dirá que estou inconsciente. Na realidade, posso estar mais agudamente consciente, apenas incapaz de comunicar ou de relembrar.
P: Estou fazendo uma simples pergunta: há cerca de quatro bilhões de pessoas no mundo e todas estão obrigadas a morrer. Qual será a condição delas após a morte - não fisicamente, mas psicologicamente? A consciência delas continuará? E, se continuar, em que forma? Não me diga que não estou fazendo a pergunta certa, ou que você não conhece a resposta, ou que em seu mundo minha questão não tem sentido; no momento em que você começa a falar sobre seu mundo e sobre o meu mundo como diferentes e incompatíveis, você constrói um muro entre nós. Ou nós vivemos em um mundo ou sua experiência não tem nenhuma utilidade para nós.
M: Certamente, nós vivemos em um mundo. Apenas eu o vejo como ele é, enquanto você não. Você se vê no mundo, enquanto eu vejo o mundo em mim mesmo. Para você, você nasce e morre, enquanto, para mim, o mundo aparece e desaparece. Nosso mundo é real, mas sua visão dele não o é. Não há muro nenhum entre nós, exceto o que foi construído por você. Não há nada errado com os sentidos, é sua imaginação que o leva para o caminho errado. Ela cobre o mundo como ele é com o que você imagina que o mundo seja - algo que existe independentemente de você e, ainda assim, seguindo intimamente os seus padrões herdados ou adquiridos. Há uma profunda contradição em sua atitude, a qual você não vê, e que é a causa da aflição. Você se apega à ideia de que nasceu em um mundo de dor e aflição; eu sei que o mundo é filho do amor, tendo seu começo, crescimento e realização no amor. Mas eu estou até mesmo além do amor.
P: Se você criou o mundo devido ao amor, por que ele está tão cheio de dor?
M: Tem razão - do ponto de vista do corpo. Mas você não é o corpo. Você é a imensidão e o infinitude da consciência. Não assuma o que não é verdadeiro e você verá as coisas como eu as vejo. Dor e prazer, bom e mau, certo e errado são termos relativos e não devem ser tomados absolutamente. Eles são limitados e temporários.
P: Na tradição budista se diz que um Nirvani, um Buda iluminado, tem a liberdade do universo. Ele pode conhecer e experimentar por si mesmo tudo o que existe. Pode ordenar e interferir na natureza, na cadeia de causalidade, mudando a sequência dos eventos, desfazendo inclusive o passado! O mundo ainda está com ele, mas ele está livre no mundo.
M: O que você descreve é Deus. Certamente, onde há um universo, haverá também sua contrapartida, que é Deus. Mas eu estou além de ambos. Havia um reino em busca de um rei. Eles acharam o homem certo e o fizeram rei. Ele não havia mudado de maneira alguma. Meramente lhe foram dados o título, os direitos e os deveres de um rei. Sua natureza não foi afetada, apenas suas ações. É de modo similar com o homem iluminado; o conteúdo de sua consciência experimenta uma transformação radical. Mas ele não se desencaminha. Ele conhece o imutável.
P: O imutável não pode ser consciente. A consciência é sempre de mudança. O imutável não deixa nenhum sinal na consciência.
M: Sim e não. O papel não é o escrito, ainda assim carrega o escrito. A tinta não é a mensagem, tampouco a mente do leitor o é - mas todos eles tornam possível a mensagem.
P: A consciência provém da realidade ou é um atributo da matéria?
M: A consciência como tal é a contrapartida sutil da matéria. Como a inércia (tamas) e a energia (rajas) são atributos da matéria, assim a harmonia (sattva) manifesta-se como consciência. Você pode considerá-la de certo modo como uma forma de energia muito sutil. Onde a matéria se organiza em um organismo estável, a consciência aparece espontaneamente. Com a destruição do organismo, a consciência desaparece.
P: O que sobrevive então?
M: Aquilo do qual a matéria e a consciência são apenas aspectos, o que nem nasce nem morre.
P: Se está além da matéria e da consciência, como pode ser experienciado?
M: Pode ser conhecido por seus efeitos em ambas: busque-o na beleza e na felicidade. Mas você não compreenderá nem o corpo nem a consciência, a menos que vá além de ambos.
P: Por favor, fale-nos com sinceridade: você é consciente ou inconsciente?
M: O iluminado (gnani) não é nem um nem outro. Mas, em sua iluminação (gnana), tudo está contido. A Consciência contém toda a experiência. Mas o que está ciente está além de toda a experiência. Ele está além da própria Consciência.
P: Há o fundamento da experiência, chame-a matéria. Há o experienciador, chame-a mente. O que faz a ponte entre os dois?
M: A própria abertura entre os dois é a ponte. Aquilo que em uma ponta parece matéria e, na outra, mente, é em si mesmo a ponte. Não separe a realidade em mente e corpo, e não haverá nenhuma necessidade de pontes. Ao surgir a consciência, o mundo surge. Quando você considera a sabedoria e a beleza do mundo, você o chama Deus. Conheça a fonte de tudo isto, a qual está em você mesmo, e notará que foram respondidas todas as suas perguntas.
P: O que vê e o visto são um ou dois?
M: Há apenas visão; o que vê e o visto estão contidos nela. Não crie diferenças onde não há nenhuma.
P: Comecei com a pergunta sobre o homem que morreu. Você disse que suas experiências se desenvolverão de acordo com suas expectativas e crenças.
M: Antes que você nascesse, você esperava viver de acordo com um plano que você mesmo havia estabelecido. Sua própria vontade foi a espinha dorsal de seu destino.
P: Certamente, o karma interferiu.
M: O karma molda as circunstâncias: as atitudes são as suas próprias. No final das contas, seu caráter dá forma à sua vida, e só você pode dar forma ao seu caráter.
P: Como se dá forma ao caráter de alguém?
M: Por vê-lo como é, e lamentando-o sinceramente. Este ver-sentir completo pode fazer milagres. É como moldar uma imagem em bronze; só o metal, ou só o fogo será inútil; nem o molde será de alguma utilidade; você tem que fundir o metal no calor do fogo e vertê-lo no molde.
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