81- A CAUSA RAIZ DO MEDO

Pergunta: De onde você veio? 

Maharaj: Sou dos Estados Unidos, mas vivo principalmente na Europa. Cheguei à índia recentemente. Estive em Rishikesh, em dois Ashrams. Ensinaram-me meditação e respiração. 

M: Quanto tempo esteve lá? 

P: Oito dias em um e seis em outro. Eu não era feliz ali e saí. Então, durante três semanas, estive com os lamas tibetanos. Mas estavam todos eles inteiramente ocupados com fórmulas e rituais. 

M: E qual foi o claro resultado de tudo isso? 

P: Definitivamente, houve um aumento de energia. Mas, antes de ir a Rishikesh, fiz jejum e dieta em um Sanatório de Cura Natural em Pudukkotai, no sul da índia. Fez-me um enorme bem. 

M: Talvez o aumento de energia se deva a uma saúde melhor. 

P: Não posso afirmar isto. Mas, como resultado de todas estas tentativas, alguns fogos começaram a arder em vários lugares de meu corpo, e ouvi cantos e vozes onde não havia nenhum. 

M: E o que você busca agora? 

P: Bem, o que todos buscamos? Alguma verdade, alguma certeza interior, alguma felicidade real. Nas distintas escolas de auto realização se fala tanto da Consciência que se acaba com a impressão de que a própria Consciência é a realidade suprema. É assim? Do corpo cuida o cérebro, o qual é iluminado pela consciência; a Consciência vigia a consciência; há algo além da Consciência? 

M: Como você sabe que é consciente? P: Sinto que sou. Não posso expressá-lo de outro modo. 

M: Quando você segue cuidadosamente do cérebro através da consciência para a Consciência, você se dá conta de que o sentido de dualidade persiste. Quando você vai além da Consciência, há um estado de não dualidade, no qual não há cognição, apenas ser puro, que pode ser também chamado de não ser, se por ser quisermos dizer algo em particular. 

P: O que você chama ser puro é o ser universal, todo ser? 

M: Tudo implica uma coleção de particulares. No ser puro, a própria ideia do particular está ausente. 

P: Há alguma relação entre o ser puro e o ser particular? 

M: Que relação pode existir entre o que é e o que meramente parece ser? Há alguma relação entre o oceano e as ondas? O real permite que o irreal apareça e causa sua desaparição. A sucessão de momentos transi - tórios cria a ilusão do tempo, mas a realidade atemporal do ser puro não está em movimento, pois todo movimento requer um fundo imóvel. Ele é o próprio fundo. Uma vez que o tenha encontrado em si mesmo, você sabe que nunca perdeu este ser independente, livre de todas as divisões e separações. Mas não o busque na consciência, não o encontrará ali. Não o busque em nenhuma parte, pois nada o contém. Pelo contrário, ele contém tudo e manifesta tudo. É como a luz do dia que faz tudo visível enquanto ela mesma permanece invisível.

P: Senhor, para que serve que me diga que a realidade não pode ser encontrada na consciência? Em que outra parte a buscarei? Como irei apreendê-la? 

M: É muito simples. Se eu lhe pergunto qual o sabor de sua boca, tudo o que você pode fazer é dizer: não é nem doce nem amarga, nem ácida nem adstringente; é o que permanece quando todos estes sabores não existem. Similarmente, quando todas as distinções e reações deixam de ser, o que permanece é a realidade, simples e sólida. 

P: Tudo o que compreendo é que estou nas garras de uma ilusão sem princípio. E não vejo como isto pode chegar a um fim. Se pudesse, teria acontecido há muito tempo. Devo ter tido tantas oportunidades no passado como terei no futuro. O que não pode acontecer não pode acontecer. Ou, se aconteceu, não poderá durar. Nosso próprio deplorável estado depois destes incontáveis milhões de anos leva, no melhor dos casos, à promessa da extinção final ou, o que é pior, à ameaça de uma repetição interminável e sem sentido. 

M: Que prova tem você de que seu estado presente não tem princípio nem fim? Como você era antes de nascer? Como será depois da morte? E, de seu estado presente - quanto conhece? Você nem mesmo sabe qual era sua condição antes de despertar nesta manhã! Você só conhece um pouco de seu estado atual e daí retira conclusões para todos os tempos e lugares. Você pode estar apenas sonhando e imaginando que seu sonho é eterno. 

P: Chamá-lo de sonho não muda a situação. Repito minha pergunta: que esperança resta quando a eternidade atrás de mim não pode satisfazê-la? Por que meu futuro deveria ser diferente de meu passado? 

M: Em seu estado febril, você projeta um passado e um futuro e os toma como reais. De fato, você conhece apenas o momento presente. Por que não investigar o que é agora, em vez de questionar o passado e o futuro imaginários? Seu estado presente não é um estado sem princípio nem fim. Ele acaba em um instante. Observe cuidadosamente de onde vem e para onde vai. Você logo descobrirá a realidade atemporal por trás dele. 

P: Por que não o fiz antes? 

M: Da mesma forma que cada onda afunda no oceano, assim cada momento regressa para sua fonte. A realização consiste em descobrir a fonte e permanecer ali. 

P: Quem descobre? 

M: A mente descobre. 

P: Eia encontra as respostas? 

M: O que ela encontra é que se fica sem perguntas e que as respostas não são necessárias. 

P: Ter nascido é um fato. Morrer é outro fato. Como eles aparecem à testemunha? 

M: Uma criança nasceu, um homem morreu - simples eventos no curso do tempo. 

P: Há algum progresso na testemunha? A Consciência evolui? 

M: O que é visto pode sofrer muitas mudanças quando a luz da Consciência foca sobre ele, mas ele é o objeto que muda, não a luz. As plantas crescem à luz do sol, mas o sol não cresce. Por si mesmos, o corpo e a testemunha são imóveis, mas quando se juntam na mente, ambos parecem mover-se. 

P: Sim, posso ver que o que se move e muda é só o ‘eu sou’. De algum modo, o ‘eu sou’ é necessário? 

M: Quem o necessita? Está aí - agora. Teve um princípio, terá um fim. 

P: O que permanecerá quando o ‘eu sou’ desaparecer? 

M: O que não vem nem vai - permanece. É a mente sempre gananciosa que cria ideias de progresso e evolução para a perfeição. Ela perturba e fala de ordem, destrói e busca segurança. 

P: Há progresso no destino, no karma? 

M: O karma é apenas uma reserva de energias não gastas, de desejos não realizados e temores não compreendidos. Este depósito é constantemente reabastecido com novos desejos e temores. Não necessita ser assim para sempre. Compreenda a causa raiz de seus temores - o estranhamento de si mesmo: e dos desejos - o anelo por seu ser, e o seu karma irá dissolver-se como um sonho. Entre terra e céu, a vida continua. Nada é afetado, só os corpos crescem e decaem. 

P: Qual é a relação entre a pessoa e a testemunha? 

M: Não pode haver relação entre elas porque elas são um. Não separe e não busque relacionamento. 

P: Se o que vê e o visto são um, como ocorre a separação? 

M: Fascinado pelos nomes e formas que, por sua própria natureza, são distintos e diversos, você diferencia o que é natural e separa o que é um. O mundo é rico em diversidade, mas você se sente estranho e assustado devido ao mal-entendido; é o corpo que está em perigo e não você. 

P: Posso ver que a ansiedade biológica básica, o instinto de conservação, toma muitas formas e distorce meus sentimentos e pensamentos. Mas como surgiu esta ansiedade? 

M: É um estado mental causado pela ideia ‘Eu sou o corpo’. Ele pode ser eliminado pela ideia contrária: ‘Eu não sou o corpo’. Ambas as ideias são falsas, mas uma elimina a outra. Entenda que nenhuma ideia é sua, que todas chegam de fora. Você deve refletir sobre tudo isso por si mesmo, converta-se no objeto de sua meditação. O esforço para compreender-se é Ioga. Seja um iogue, dedique sua vida a isso, rumine, pergunte, busque até chegar à raiz do erro e à verdade além dele. 

P: Na meditação, quem medita, a pessoa ou a testemunha? 

M: A meditação é uma tentativa deliberada de penetrar estados mais elevados de consciência e, finalmente, ir além deles. A arte da meditação é a arte de desviar o foco da atenção para níveis cada vez mais sutis, sem perder o controle sobre os níveis deixados para trás. De certo modo, é como ter a morte sob controle. Começa-se com os níveis mais baixos - circunstâncias sociais, costumes e hábitos; entorno físico, postura e respiração do corpo; os sentidos, suas sensações e percepções; a mente, seus pensamentos e sentimentos - até que o mecanismo inteiro da personalidade seja agarrado e segurado firmemente. A etapa final da meditação é alcançada quando o sentido de identidade vai além de ‘eu-sou-assim-e-assim’, além de ‘isso sou eu’, além de ‘eu sou só a testemunha’, além até do ‘estar aí’, além de todas as ideias, até alcançar o puro Ser impessoal mente pessoal. Mas você deve ser enérgico quando se dedica à meditação. Definitivamente, não é uma ocupação a tempo parcial. Limite seus interesses e atividades ao que é necessário para você e às necessidades mais básicas de seus dependentes. Guarde todas suas energias e tempo para romper o muro que a mente construiu ao redor de você. Acredite-me, você não se arrependerá. 

P: Como sei que a minha experiência é universal? 

M: Ao final de sua meditação, tudo é conhecido diretamente, não se pede nenhuma prova, seja qual for. Do mesmo modo que cada gota do oceano tem o sabor do oceano, assim também cada momento leva o sabor da eternidade. As definições e descrições têm seu lugar como incentivos úteis para buscar adiante, mas você deve ir além delas, para dentro do indefinível e indescritível, exceto em termos negativos. Depois de tudo, mesmo a universalidade e a eternidade são meros conceitos, o contrário de estar limitado no espaço e no tempo. A realidade não é um conceito, nem a manifestação de um conceito. Ela não tem nada que ver com os conceitos. Preocupe-se com sua mente, elimine suas distorções e impurezas. Uma vez que tenha o sabor de seu próprio eu, encontrá-lo-á em todas as partes e em todo tempo. Portanto, é muito importante que você chegue a isso. Uma vez conhecido, nunca o perderá. Mas você deve se dar uma oportunidade através da intensiva, mesmo árdua, meditação. 

P: Que você quer exatamente que eu faça? 

M: Entregue seu coração e sua mente à consideração sobre o ‘eu sou’, sobre o que é, como é, qual sua origem, sua vida, seu significado. É muito parecido com o cavar de um poço. Você rejeita tudo o que não é água até que alcança o manancial doador de vida. 

P: Como saberei que estou me movendo na direção correta? 

M: Mediante seu progresso na determinação, na claridade e devoção à tarefa. 

P: Nós, europeus, achamos difícil manter-nos tranquilos. Somos demasiado mundanos. 

M: Oh, não. Vocês também são sonhadores. Nós só diferimos no conteúdo de nossos sonhos. Você busca a perfeição no futuro. Nós estamos decididos a encontrá-la no agora. Só o limitado pode ser aperfeiçoado. O ilimitado já é perfeito. Você é perfeito, só não o sabe. Aprenda a conhecer a si mesmo e você descobrirá maravilhas. Tudo que você precisa já está dentro de você, você somente deve se aproximar ao seu ser com reverência e amor. A condenação e a desconfiança de si mesmo são erros graves. Sua constante fuga da dor e busca do prazer é um sintoma do amor que você dedica a si mesmo; tudo o que lhe peço é isto: torne o amor por você mesmo perfeito. Não se negue nada. conceda-se o infinito e a eternidade, e descubra que não necessita deles: você está além.

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