Pergunta: Vim de um país distante. Eu tive algumas experiências internas próprias e gostaria de comparar impressões.
Maharaj: Claro que sim. Você conhece a si mesmo?
P: Eu sei que não sou o corpo. Tampouco sou a mente.
M: O que o faz dizê-lo?
P: Não sinto que sou o corpo. Sinto que estou em todo lugar, por toda parte. Com referência à mente, posso ligá-la ou desligá-la, por assim dizer. Isto me faz sentir que não sou a mente.
M: Quando você sente que está em os lugares no mundo, você permanece separado do mundo? Ou você é o mundo?
P: As duas coisas. Algumas vezes sinto que não sou nem a mente nem o corpo, mas um único olho que tudo vê. Quando aprofundo nisso, descubro que sou tudo o que vejo, e o mundo e meu eu se tornam um.
M: Muito bem. E os desejos? Tem algum? P: Sim, eles surgem, breves e superficiais.
M: E o que faz com eles?
P: O que posso fazer? Eles vêm e vão. Eu olho para eles. Algumas vezes vejo meu corpo e minha mente ocupados em satisfazê-los.
M: De quem são estes desejos que são satisfeitos? P: Eles são parte do mundo em que vivo. Existem simplesmente como as árvores e as nuvens.
M: Eles não são o sinal de alguma imperfeição?
P: Por que deveriam ser? São como são, e eu sou como sou. Como poderia afetar-me o aparecimento e o desaparecimento dos desejos? Certamente, eles afetam a forma e o conteúdo da mente.
M: Muito bem. Em que trabalha?
P: Sou oficial de justiça.
M: O que isto significa?
P: Os infratores juvenis são postos em liberdade condicional, e há oficiais especiais que vigiam o comportamento deles, ajudando-os a se preparar e encontrar emprego.
M: Você deve trabalhar?
P: Quem trabalha? O trabalho acontece.
M: Você necessita trabalhar?
P: Necessito, para ganhar dinheiro. Eu gosto dele porque me põe em contato com seres vivos.
M: Para que os necessita?
P: Pode ser que eles me necessitem, e são seus destinos que me fizeram ficar com este emprego. No final das contas, é uma só vida.
M: Como chegou a seu estado atual?
P: Os ensinamentos de Sri Ramana Maharshi me colocaram no caminho. Depois encontrei Douglas Harding, que me ajudou mostrando-me como trabalhar com o ‘Quem sou eu?’.
M: Foi repentino ou gradual?
P: Totalmente repentino. Como algo totalmente esquecido que volta à mente. Ou como um relâmpago instantâneo de entendimento. ‘Quão simples’, disse, ‘Quão simples, não sou o que pensava ser! Não sou nem o percebido nem o que percebe, sou apenas o perceber’.
M: Nem sequer o perceber, mas aquele que faz possível tudo isto.
P: Que é o amor?
M: Quando o sentido de distinção e separação está ausente, pode chamá-lo amor.
P: Por que tanto estresse sobre o amor entre o homem e a mulher?
M: Porque o elemento da felicidade é muito proeminente nele.
P: Não é assim em todo amor?
M: Não necessariamente. O amor pode causar dor. Então, chame-o compaixão.
P: O que é felicidade?
M: A harmonia entre o interior e o exterior é felicidade. Por outro lado, a autoidentificação com as causas externas é sofrimento.
P: Como acontece a autoidentificação?
M: O eu, por sua própria natureza, conhece apenas a si mesmo. Por falta de experiência, o que quer que ele perceba toma-a por si mesmo. Golpeado, aprende a discernir (viveka) e a viver só (vairagya). Quando o comportamento correto (uparati) se torna normal, um poderoso impulso interno (mumukshutva) o faz buscar sua própria origem. A vela do corpo se acende e tudo se torna claro e brilhante (atmaprakash).
P: Qual é a verdadeira causa do sofrimento?
M: A autoidentificação com o limitado (vyaktitva). As sensações como tais, por muito fortes que sejam, não causam sofrimento. É a mente, confundida por ideias erradas, viciada em pensar ‘Eu sou isto, Eu sou aquilo’, que teme perder e anseia ganhar, e sofre quando fica frustrada.
P: Um amigo meu estava acostumado a ter, noite após noite, sonhos horríveis. Dormir o aterrorizava. Nada podia ajudá-lo.
M: A companhia dos verdadeiramente bons (satsang) o ajudaria.
P: A própria vida é um pesadelo.
M: A amizade nobre (satsang) é o remédio supremo para todas as enfermidades, físicas ou mentais.
P: Geral mente não se consegue encontrar tal amizade.
M: Busque dentro de você. Seu próprio eu é o seu melhor amigo.
P: Por que a vida é tão cheia de contradições?
M: Ela serve para romper o orgulho mental. Nós devemos compreender quão pobres e impotentes nós somos. Enquanto nos enganarmos com o que imaginamos ser, conhecer, ter, fazer, nós estaremos em uma triste situação, sem dúvida. Só na autonegação completa há uma oportunidade de descobrir nosso ser real.
P: Por que dar tanta importância à autonegação?
M: Tanto quanto dar importância à autorrealização. O eu falso deve ser abandonado antes que o eu real possa ser encontrado.
P: O ser que você escolheu chamar falso é para mim perturbadora- mente real. É o único ser que conheço. O que você denomina eu real é um mero conceito, um modo de falar, uma criação da mente, um fantasma atrativo. Meu eu do dia a dia não é uma beleza, admito-o, mas é meu único e próprio eu. Você diz que sou, ou tenho, outro eu. O que você vê é real para você, ou quer que eu acredite no que você mesmo não vê?
M: Não tire conclusões precipitadas. O concreto não necessita ser o real, o que se concebe não precisa ser falso. As percepções baseadas nas sensações e as que a memória deu forma implicam um percebedor, cuja natureza você nunca se preocupou em examinar. Dedique a ele toda sua atenção, examine-o com amoroso cuidado e descobrirá as alturas e profundezas do ser as quais jamais sonhou, mergulhado que está em sua fraca imagem de você mesmo.
P: Necessito estar em condições adequadas para examinar-me com proveito.
M: Você deve ser sério, decidido, verdadeiramente interessado. Deve estar cheio de boa vontade em relação a si mesmo.
P: Sou muito egoísta.
M: Não o é. Você está todo o tempo destruindo a si mesmo e o que é seu ao servir deuses estranhos, hostis e falsos. Sem dúvida, seja egoísta do modo certo. Deseje o bem para si mesmo, trabalhe naquilo que seja bom para você. Destrua tudo o que se interponha entre você e a felicidade. Seja tudo, ame tudo, seja feliz e faça felizes os demais. Não há felicidade maior.
P: Por que há tanto sofrimento no amor?
M: Todo sofrimento nasce do desejo. O amor verdadeiro nunca é frustrado. Como poderia frustrar-se o sentido de unidade? O que pode ser frustrado é o desejo de expressão. Tal desejo é da mente. Como com todas as coisas mentais, a frustração é inevitável.
P: Qual é o lugar do sexo no amor?
M: O amor é um estado de ser. O sexo é energia. O amor é sábio; o sexo, cego. Uma vez entendida a natureza verdadeira do amor e do sexo, não haverá conflito ou confusão.
P: Há tanto sexo sem amor.
M: Sem amor tudo é nocivo. A própria vida sem amor é nociva.
P: O que pode fazer-me amar?
M: Você é o próprio amor - quando não tem medo.
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